O uso do blog como ferramenta pedagógica
Favorece a participação coletiva, formando autores, coautores, leitores assíduos e alunos mais envolvidos com a leitura e a escrita
Por Claudia Rodrigues*
A inquietação é o que move um professor. Essa lição eu aprendi nos primeiros dias da faculdade, influenciada por alguns professores que desenvolviam pesquisas sobre a prática de ensino. Durante a graduação, eu acreditava que essa inquietação era apenas a ansiedade e o desejo de dar aulas. Mas, com o tempo, entendi que se inquietar diante das adversidades de uma sala de aula trata-se mais de um perfil que o educador deve desenvolver.
Muitos professores têm a mesma inquietação: reconhecemos a
importância da tecnologia para o ensino e a aprendizagem, mas sabemos
pouco o que fazer com ela. Sem muita informação, abre-se espaço para as
velhas crenças: a tecnologia vai substituir o professor e a internet irá
acabar com a linguagem. Enfim, são crenças ultrapassadas que mascaram o
medo do professor inovar.
Antes de iniciar minha pesquisa de mestrado, minha inquietação era
sobre como trabalhar com tecnologia em sala de aula. Não tinha
conhecimento, mas era movida pela tese de que deveríamos deixar de lados
os modismos e procurar pôr práticas eficientes, que pudessem colaborar
mais com o ensino. Assim, realizei uma pesquisa empírica na tentativa de
compreender melhor o uso da tecnologia em sala e estabelecer parâmetros
de uso do recurso com maior eficiência. Como fundamentação do estudo,
destaquei a importância da tecnologia no contexto educacional e a
emergência de novos gêneros discursivos nas aulas de português. Esses
pontos levaram também à revisão da prática de ensino que hoje não pode
excluir a linguagem e a comunicação que ocorrem na internet.
O objetivo central da pesquisa foi o de estudar como o blog
poderia ser utilizado enquanto estratégia motivadora para o ensino de
escrita na escola. Os caminhos me levaram a um estudo voltado para a
pesquisa-ação, já que o ponto de partida era o contexto em que eu
trabalhava. As ferramentas pedagógicas que tinha a meu dispor e o que
sabia sobre elas exigiam uma mudança de postura pedagógica, pois, embora
considerasse a internet um recurso legítimo e contemporâneo para o
trabalho em sala de aula, pouco sabia o que fazer com a tecnologia
durante as aulas.
Inicialmente, elaborei um blog que tinha como proposta
verificar a validade de minhas concepções. Foi um fracasso. Embora ele
indicasse um alto número de acessos, havia apenas uma participação. Ao
buscar pistas que pudessem responder o porquê do insucesso, a análise
dos dados apontou que o espaço tinha um dono: o professor, já que o blog
era centralizado em sua imagem, suas intenções, suas crenças, seus
objetivos e suas leituras. Os alunos não participavam porque não
entendiam a tarefa. O intuito do blog estava distante deles. No
começo, pensei em abandonar o estudo e reconhecer que a relação
internet e ensino era verdadeiramente uma “moda”. Mas as pistas
sinalizavam também para outras descobertas.
Na verdade, o blog revelou tudo o que não se deve fazer
quando se usa tecnologia em sala de aula. O insucesso conduziu a um novo
estudo que foi formatado a partir das pistas que orientavam o que não
dá certo com o uso da tecnologia para o ensino. Se o blog
anteriormente era do professor, passou a ser dos alunos, novos
produtores ativos na construção e elaboração da tarefa. Mas a intenção
original do trabalho foi mantida: em sala iniciavam-se as discussões,
que prosseguiam no ambiente virtual – já que a falha não foi o recurso e
sim a metodologia do professor.
O resultado foi o envolvimento dos alunos com outras disciplinas para a coleta de dados, discussão e publicação dos textos nos blogs.
O interesse pela leitura e escrita aumentou quantitativa e
qualitativamente, se comparado ao manifestado nas aulas tradicionais que
ministrava. O envolvimento dos alunos nas aulas também foi
diferenciado. Era visível a inquietação deles em pesquisar, buscar
dados, saber o que os colegas estavam escrevendo, solicitar a leitura do
colega antes do texto ser publicado, bem como foi possível perceber
também a busca em outras fontes de informação, não somente aquelas
indicadas pelo professor. Os alunos passaram a ser verdadeiramente
ativos, aplicando autonomia na aprendizagem.
Sobre o uso da linguagem nos blogs, os alunos
mostraram a familiaridade com construções hipertextuais e com integração
de linguagens. Os textos disponibilizados para os leitores virtuais
incluíam links para outras mídias, gêneros e tipos textuais. A escrita
convencional não seria o suficiente para esta dinâmica. E, ao contrário
do que muitos estudiosos pensam, os alunos se preocuparam mais com a
escrita, com o desenvolvimento do discurso, a argumentação dos textos.
Isso porque o blog é um ambiente público, e eles não teriam o
controle de quem e quando seriam lidos os seus textos. O professor
deixou de ser o único leitor.
A pesquisa mostrou os desafios que teremos que enfrentar para mudar
nossos modos de ensino mais tradicionais. Além de superar antigos
problemas já debatidos na literatura sobre ensino de língua materna,
hoje temos que ter, igualmente, a preocupação em favorecer o acesso à
comunicação no meio digital. E o uso do blog como tarefa de
sala de aula favorece a prática de produção textual porque promove maior
engajamento dos alunos, propicia a leitura de uma diversidade de
gêneros disponibilizados na internet, gera debates mediados pela
escrita. O trabalho com blogs em aulas de produção
textual é favorável devido ao seu contexto de produção. As aulas
tradicionais têm em média 50 minutos e, quando a aula termina, o
conteúdo é finalizado. No blog não há limitação de tempo.
Várias outras ferramentas são utilizadas para otimizar as discussões,
como a hipermídia e a multimídia.
O blog, como ferramenta para o professor, é uma
possibilidade de aperfeiçoar o seu trabalho, estendendo a sua disciplina
no tempo e no espaço, que pode ser usado para oferecer outras fontes de
pesquisa para o aluno. É dinâmico para a argumentação, leitura,
questionamento, crítica. O blog favorece a participação
coletiva, formando autores, coautores, leitores assíduos e alunos mais
envolvidos com a leitura e a escrita. O blog pode servir como
um diário de bordo, como espaço de discussão de temas entre professor e
aluno, ser utilizado como resultado de uma pesquisa que foi desenvolvida
em sala, entre inúmeras utilidades que ainda estão por vir.
A ferramenta em discussão, o blog, é na verdade apenas mais
um espaço – entre tantos que o professor pode explorar –, um pretexto
para entender que o uso de tecnologia na escola é inevitável. Enquanto
os professores têm resistência em aderir aos gêneros digitais, nossos
alunos respiram tecnologia. Trazer este aluno para a sala de aula exige
dinamismo. Neste sentido, a tecnologia pode contribuir. No entanto, o
uso das páginas digitais demanda mudanças sensíveis no perfil do
professor: ele deixa de ser o fornecedor dos textos, aquele que controla
o debate e avalia os textos produzidos. O professor passa a ser mais um
orientador e, embora ainda avalie e dê nota ao conteúdo produzido no blog, na prática deixa de ser o leitor-alvo dos textos.
* Claudia Rodrigues é professora do ensino médio do Colégio Marista de Uberlândia e autora da pesquisa O uso de blogs como estratégia motivadora para o ensino de escrita na escola, Unicamp, 2008.